Da Cota de PcD à Inclusão: Uma Mudança de Paradigmas

Na passagem do Estado do bem estar social para o capitalismo do bem estar social, temos a tão falada sigla “ESG” (Environmental, Social and Governance), que significa a preocupação com o meio ambiente, a parte social e a governança corporativa, que as empresas precisam ter para se adequarem às novas demandas do mercado global.

O “S” de Social diz respeito a tudo que se refere a pessoas. Simples assim. Relacionamento com funcionários e terceirizados, fornecedores, clientes e comunidades, a exemplo das relações de trabalho, diversidade e inclusão, privacidade e proteção de dados.

É justamente aí que reside uma grande oportunidade de as empresas praticarem ESG, atendendo tanto aos anseios dos stakeholders de uma forma geral, dos investidores, dos financiadores, como do cada vez mais exigente mercado consumidor, além dos próprios colaboradores. Vale lembrar que os colaboradores, por vezes, também são consumidores, e se engajados e comprometidos com os valores da organização, são mais produtivos, e a reboque, geram uma exposição positiva da marca.

Está provado que investir em diversidade traz lucro porque as empresas que o fazem são mais lucrativas, sabem lidar melhor com as adversidades, produzem inovação etc. Há estatísticas disponíveis numa rápida busca na internet. Quando se trata de inclusão de Pessoa com Deficiência, um dos pilares da diversidade, dentre outros, como a diversidade de gênero, racial, etária e LGBTQIAP+, existe um agravante a ser considerado, que é a obrigação legal. Ou seja, cumprir o que se convencionou chamar de “Cota de PcD” para empresas com mais de 100 (cem) empregados, além de ser um ditame de sustentabilidade e prática de ESG, tem força cogente de um mandamento legal, sob pena de multas altas e reiteradas se não for levada a efeito, conforme a determinação da Lei 8.213/91:

Art. 93. A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:

I – até 200 empregados…………………………………………………..2%;

II – de 201 a 500……………………………………………………………..3%;

III – de 501 a 1.000………………………………………………………….4%; 

IV – de 1.001 em diante …………………………………………………..5%.

A realidade é que muitas empresas não têm conseguido cumprir a cota legal, seja por excessos cometidos pela fiscalização, seja por falta de um melhor entendimento sobre o conceito. Não viemos para lamentar, vamos às soluções!

Com o advento da Lei Brasileira de Inclusão ou Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), o conceito de PcD, em constante evolução, tornou-se amplo e subjetivo: 

Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Já a caracterização da deficiência pode ficar cargo de uma junta de profissionais da área médica, que tem a responsabilidade de elaborar o Laudo biopsicossocial, numa avaliação que vai cotejar o contexto ao qual aquele indivíduo está inserido. O olhar passou a ser voltado à funcionalidade, e não à doença.

Com isso, quem assina o Laudo Caracterizador da Deficiência, que não precisa mais necessariamente ser um médico, se utilizará não só da lista de doenças do Decreto 3.298/99 e da já conhecida CID (Classificação Internacional de Doenças), mas também lançará mão da CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade) e do IFBR-M (Índice de Funcionalidade Brasileiro).

O que se observa é uma verdadeira mudança de paradigma, na medida em que deve ser ultrapassado o antigo modelo médico de estrutura da deficiência (não inclusivo, no qual o médico tinha como objetivo, se possível, adaptar a pessoa com deficiência à sociedade) para o novo modelo social de estrutura da deficiência, verdadeiramente inclusivo, onde a junta de profissionais da área médica visa eliminar todas as barreiras para que as pessoas com deficiência possam participar da vida em sociedade.

Considerando que o ramo da Construção (leve ou pesada) é o primeiro responsável por promover acessibilidades arquitetônica e urbanística, itens de extrema importância para os avanços da população em geral, mais ainda das pessoas com qualquer tipo de mobilidade reduzida, incluídas aí as Pessoas com Deficiência, a relevância em se pensar sobre o assunto é primordial e urgente.

Somos uma indústria que sempre pautou os assuntos mais relevantes do país, e dessa vez, precisamos nos mobilizar pela causa das Pessoas com Deficiência porque podemos e devemos ser protagonistas e agentes dessa necessária transformação social.

Essas mudanças passam, certamente, pelo empenho das empresas na superação das barreiras atitudinais, pela adequação da fiscalização e pelo entendimento dos conceitos delineados sobre a temática.

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Luciene Romanelli Barreto

Consultora Trabalhista Empresarial, Fundadora da Paixão por Pessoas, palestrante, advogada, escritora, feminista, mãe do João Francisco, formada em Direito há mais de 15 anos, LL.M. em Direito Corporativo, pós-graduanda em Psicologia Organizacional e Gestão de Pessoas e idealista de um mundo mais humanizado.

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